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quinta-feira, novembro 28, 2013

O Arsenal Real da Marinha do Rio de Janeiro



        

O Arsenal Real da Marinha foi criado no Brasil em 1763 pelo Vice-Rei António Álvares da Cunha, e ficou na praia de São Bento, na cidade do Rio de Janeiro.


      



      

A fundação de um arsenal para reparo e construção de navios de guerra foi resultado de uma conjuntura de factores, como a descoberta de ouro e prata na região de Minas Gerais no final do século XVII e a transferência da sede de Governo Português de Salvador para o Rio de Janeiro, o que deslocou para a região Centro-Sul o poder económico da colónia e exigiu uma maior preocupação com a defesa militar. Além disso, os frequentes conflitos com a Espanha reforçaram a necessidade de aumentar a capacidade bélica do Brasil.

      
Até ao século XVIII a actividade de construção e reparo de embarcações na América portuguesa era realizada por particulares e em estaleiros artesanais, que se atendiam às necessidades do transporte e da tonelagem das embarcações que atracavam no litoral após cruzar o Atlântico. Esta situação foi alterada durante o reinado de Don José (1750-1777), quando o Ministro do Reino Don Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, quando empreenderam um amplo conjunto de reformas tendo como objectivo equilibrar as finanças do Estado português, a política pombalina, num período em que a produção aurífera dava sinais de declínio, orientou-se para o estímulo à agricultura, às actividades manufactureiras e ao comércio. Para tanto, estruturou-se um tratado legal que procurava dar maior eficiência e centralização às decisões políticas e administrativas das matérias pertinentes a cada uma das secretarias de Estado, bem como se executaram medidas que pretendiam suplantar as deficiências de arrecadação dos direitos e rendas reais, além de especializar a gestão das contas públicas e melhorar a fiscalização de impostos e tributos. O projecto de reformas do Marquês de Pombal, incluiu também as forças Navais Portuguesas, cuja militarização e profissionalização constituíram-se como fundamentais para defesa da enorme frota mercante que era essencial para o comércio entre o império e seus domínios ultramarinos. A reformulação empreendida na Marinha Real Portuguesa articulou-se em torno de três eixos: a construção naval, a militarização das forças navais, (e o reforço de seu papel junto ao Estado), e a criação de escolas para a formação de pessoal especializado. A Ribeira das Naus, o principal estaleiro português, destruído pelo terremoto de 1755, deu lugar a um complexo manufactureiro naval, o Arsenal de Marinha de Lisboa, subordinado à Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha. Esta iniciativa foi acompanhada por outras providências, como a contratação de trabalhadores especializados, o emprego de novas técnicas de construção naval e a instalação de arsenais similares ao de Lisboa em vários pontos do império ultramarino. O primeiro estaleiro capaz de instalado na colónia capaz de construir embarcações de grande porte, como naus e fragatas, foi o de Belém, em 1761, seguido pelo do Rio de Janeiro, em 1763, e o da Bahia, que apesar de datar de 1651, sofreu reformas para adequar-se aos novos propósitos dos arsenais da Marinha Real Portuguesa.

      

No caso do Rio de Janeiro, apesar do Conde da Cunha ter principiado as actividades do Arsenal de Marinha Real em 1763, dando início a construção de uma nau de guerra, somente em 31 de Janeiro de 1765 foi dada a aprovação formal para o estabelecimento de um estaleiro visando a construção de embarcações de grande porte na cidade. Apesar disto, até 1796 o Arsenal Real da Marinha no Rio de Janeiro não foi dotado de organização própria. A reorganização da Marinha empreendida no período pombalino colocou os arsenais portugueses directamente subordinados à Secretaria da Marinha, mas havia ainda a necessidade de estabelecer uma autoridade capaz de gerir as verbas necessárias ao funcionamento dos arsenais instalados na colónia, especialmente onde faltava um funcionário ligado às forças navais. Esta função foi inicialmente assumida pelos provedores da Fazenda Real, cujas atribuições incluíam o controlo dos recursos destinados ao funcionamento dos arsenais. Posteriormente, o alvará de 3 de Março de 1770 criou o cargo de intendente da Marinha para o arsenal de Salvador, o principal da América, devendo o mesmo ser preenchido por um oficial superior da Marinha portuguesa, sob as ordens do Ministério da Marinha e Ultramar. O estabelecimento de um intendente para assumir a função de direcção do arsenal procurou também evitar a má administração dos recursos, bem com o desperdício e a corrupção. A importância dos arsenais instalados na colónia pode ser dimensionada pelo gradual aumento do controle de suas actividades pelo Estado, expresso ao longo das sucessivas reformas das forças navais. Após a morte de Don José, uma série de medidas foi adoptado sob o reinado de Dona Maria I (1777-1792), visando a continuidade do processo de profissionalização da Marinha Real Portuguesa.


    
      
A carta de lei de 26 de Outubro de 1796 regulamentou o Arsenal Real de Marinha de Lisboa, criou uma Junta de Fazenda para a sua administração e colocou sob sua fiscalização os arsenais estabelecidos no Brasil. Da mesma forma, no último quartel do século XVIII, a Marinha portuguesa experimentou um esforço de modernização, com a criação de órgãos como Academia Real de Marinha (1779), a Companhia dos Guardas-Marinhas (1782), a Real Academia dos Guardas-Marinhas (1796), o Corpo de Engenheiros Construtores (1787), a Brigada Real da Marinha (1797), o Hospital da Marinha (1796), a Junta de Fazenda da Marinha (1796) e as juntas de Fazenda das Esquadras (1797). O processo de reestruturação da Marinha se fez valer na América portuguesa com a criação do cargo de Intendente de Marinha Real nos arsenais das capitanias, pelo alvará de 12 de Agosto de 1797, com a finalidade de estabelecer o mesmo sistema de administração e contabilidade que se praticava no Arsenal Real de Lisboa, e que já era utilizado no Arsenal Real da Bahia, Belém e Goa. Cabia ao intendente, além da administração do arsenal sob sua responsabilidade, informar à Junta da Fazenda de sua capitania as obras que se faziam necessária em cada arsenal e enviar o mapa de despesa mensal à Real Junta da Fazenda da Marinha de Lisboa e ao Conselho do Almirantado. Além disto, foi disposto ainda que o intendente teria voto nas Juntas de Fazenda de sua capitania. A análise das atribuições conferidas pelo alvará ao Inspector do Real Arsenal nos fornece uma perspectiva da estrutura e organização do órgão. Ao Inspector competia a direcção dos trabalhos do Real Arsenal, ficando sob sua supervisão os construtores, mestres, apontadores, mandadores, oficiais e artífices empregados nas diferentes oficinas.

      

Como dito, sob administração do Conde da Cunha o arsenal do Rio de Janeiro construiu a Nau de Linha São Sebastião, lançada ao mar em 1767. Após a construção deste navio de guerra o arsenal do Rio de Janeiro não manteve a produção de embarcações de grande porte, como os arsenais de Belém e Salvador, sendo suplantado por estaleiros particulares. No entanto, um novo estímulo à reorganização do Arsenal Real do Rio de Janeiro se deu com a vinda da família real portuguesa em 1808. Nesta ocasião a Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos instalou-se em terras brasileiras e verificou-se ainda a criação de vários órgãos e a consequente regulamentação de suas actividades, de modo que contribuíssem com o desempenho da administração da Marinha Real no Brasil, como a Real Academia dos Guardas-Marinhas (1808). Pelo decreto de 13 de maio de 1808, Don João criou o cargo de almirante-General da Marinha, destinado exclusivamente ao príncipe Don Pedro Carlos (foi extinto com a morte do príncipe em 1812), seu sobrinho, a quem cabia, entre outras atribuições, a inspecção do Arsenal Real da Marinha da Corte. Com sua morte prematura, em 1812, o Real Arsenal voltou a estar subordinado à Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos. Nesse período, o Arsenal Real da Marinha já possuía uma tanoaria, uma ferraria e um conjunto de pequenas oficinas auxiliares. Havia também uma casa do breu e um trapiche para embarque ou desembarque de materiais, além de edifícios destinados a armazéns para guarda de materiais e comestíveis ou para residência do pessoal empregado no Real Arsenal. O decreto de 26 de marco de 1808 cita na organização do arsenal os cargos de patrão-mor e piloto-mor. Parte da estrutura do Arsenal foi estabelecida pelo alvará de 13 de maio de 1808, sendo ele composto por uma Contadoria da Marinha, Almoxarife, dois Escriturários, Pagador, três apontadores e dois guardas. Por meio da decisão n. 38, de 22 de Setembro de 1808, regulamentou-se a organização interna da Intendência, Contadoria e Almoxarifado e Ribeira. O aumento na complexidade das actividades do Arsenal Real da Marinha e da Intendência pode explicar a decisão n. 46, de 26 de Outubro de 1808, que mandou separar as autoridades de Intendente da Marinha, que respondia também pela direcção do arsenal, e de Inspector do Arsenal, que até então eram exercidas conjuntamente. Ao Inspector do Arsenal Real da Marinha coube acumular o cargo de Vice-intendente, o que denota que apesar de a decisão distinguir as funções do Real Arsenal e da Intendência da Marinha, na prática, estes dois órgãos tiveram suas atribuições estabelecidas em legislação conjunta, através de sucessivas regulamentações.

      

Por este acto foi estabelecido ainda o cargo de Vice-intendente, com a atribuição de substituir o titular nos seus impedimentos. As reformas no Arsenal Real da Marinha e o reordenamento das atribuições do Inspector, realizadas no período Joanino, determinavam que estivessem sob sua alçada atribuições bastante amplas como, por exemplo, o trabalho de construção naval e reparos da esquadra, o combate aos incêndios na cidade, o embarque de artífices que compunham as guarnições de navios, carpinteiros de machado, calafate e outros, o recrutamento de marinheiros para a esquadra e de operários para o Real Arsenal, e o fornecimento de água aos navios ancorados no porto. Nesse período, a mão-de-obra disponível no Arsenal de Marinha era composta tanto de operários, geralmente homens brancos e portugueses, que levavam seus escravos para trabalharem como ajudantes. Os operários, tal como os marinheiros, eram recrutados no meio civil, de forma compulsória, após o toque de recolher, podendo ser nacionais ou mesmo estrangeiros. Algumas profissões gozavam de privilégios e estavam isentas deste recrutamento forçado, como carpinteiros de machado, calafates e tanoeiros. No Real Arsenal funcionou ainda um complexo prisional que incluiu a conversão de um navio de linha em prisão, sistema inaugurado pela Nau de Linha 'Príncipe Real' que, fundeada no Rio de Janeiro em 1808, serviria como prisão até 1831. Foi esta embarcação que trouxe para o Brasil parte da família Real Portuguesa, mas especialmente a Rainha Dona Maria, o Príncipe Don João e seu filho, Don Pedro. Convertido em navio presídio, a Nau de Linha 'Príncipe Real' inaugurou no Brasil uma nova modalidade de sistema punitivo para onde eram enviados toda sorte de prisioneiros – recrutados à força, prisioneiros de guerra de baixa graduação, criminosos condenados pela justiça comum e pela militar – sentenciados a penas variadas e submetidos a um regime prisional rigoroso, que incluía castigos físicos. Apesar do carácter provisório da utilização de uma nau como presídio, manteve até 1831. Para a construção naval, o Arsenal lançava mão da madeira existente no Brasil, que chegava a ser exportada para Lisboa para ser empregada na construção das Naus de Linha. Os demais materiais necessários para equipar as embarcações eram, importados de Portugal ou da Inglaterra. Somava-se à falta de recursos para construção no Arsenal a escassez de verba, outra característica que marcou a trajectória do órgão. A despeito de Don Pedro Carlos, enquanto vivo, gozar de grande prestígio junto ao príncipe regente, as dificuldades económicas acabaram por determinar um baixo investimento de recursos do Erário Régio no Real Arsenal, factor determinante, para a baixa qualidade das suas instalações.

Movimento de Navios depois da abertura dos Portos Brasileiros

Anos - Portugueses - Estrangeiros 
1805 - 810 navios    -          -
1806 - 652 navios    -          -
1807 - 779 navios    -          -
1808 - 765 navios    -   90 navios
1810 - 1.214 navios -  422 navios
1819 - 1.313 navios -  340 navios
1820 - 1.311 navios -  354 navios
  


DESCREVE-SE ABAIXO O ALVARÁ DE 13/05/1808 QUE CRIA CONTADORIA GERAL DA MARINHA

"Sou servido criar também no Arsenal Real da Marinha uma Contadoria, que se denominará - Contadoria da Marinha - a qual será composta de um Contador, com ordenado anual de 400$000; de um primeiro Escriturário com o de 300$000, o qual escreverá os assentos dos navios que formam a minha Real Armada; fará as folhas das despesas da Repartição da Marinha que devem subirá minha real presença: e registará Patentes, Decretos, Avisos e mais ordens que baixarem ao Arsenal Real da Marinha; de dois Escriturários com o ordenado de 200$000 cada um, um dos quais deverá assistir aos pagamentos que fizer o Pagador dos Armazéns. Alem destes Oficiais, serão admitidos a trabalhar na Contadoria da mesma forma que já se achava em prática na dos Armazéns de Guiné, Índia e Armadas de Lisboa, os Comissários e Escrivães nos números das Naus e Fragatas desembarcados, os quais hajam prestado boas contas, e se mostrem desembaraçados de qualquer responsabilidade à minha Real Fazenda. Sou igualmente servido criar um Almoxarife de todos os Armazéns do Arsenal Real da Marinha, com o ordenado de 800$000, o qual deverá prestar anualmente as suas contas na Contadoria da Marinha: além desta obrigação permanente, deverá também presta-las ao Intendente tantas vezes, quantas este o exigir, e para o seu expediente haverá dois Escriturários, cada um com ordenado anual de 200$000, e dois Fies, com 150$000 de ordenado, por ano, cada um.  Haverá um Pagador com ordenado anual de 400$000, pessoa abonada e de notória probidade, o qual, debaixo dos princípios estabelecidos acerca dos segundos Escriturários da Contadoria, fará com ordem, prontidão e regularidade os pagamentos aos, Oficiais, tanto da minha Armada, como da Brigada Real da Marinha, desde o dia em que embarcarem, até ao em que desembarcarem; ficando os pagamentos de seus soldos de terra a cargo do Tesoureiro Geral das Tropas desta Corte, como já está em prática. E a fim de simplificar, regular e remover toda a dúvida a respeito do pagamento dos sobreditos Oficiais de um e outro Corpo: determino como regra inalterável, que todo Oficial, logo que for nomeado para embarcar, seja obrigado a apresentar na Intendência uma guia passada pelo Tesoureiro Geral das Tropas, ou atestação sua, pela qual fique constando o dia até o qual está pago dos seus soldos de Terra; e que mandado desembarcar, seja igualmente obrigado a apresentar na Intendência outra guia extraída do Livro dos Socorros, passada e assinada pelos Oficiais a quem for cometida a mostra do desarmamento, si o Oficial desembarcar por esta causa; e passada pelo Escrivão e assinada pelo Comandante da embarcação, si o desembarque do Oficial for por moléstia, ou por outro motivo qualquer, durante o armamento, pela qual conste também o dia até ao qual está pago dos seus soldos de embarcado: com o auxílio destas guias no acto de embarcar e no desembarcar, farão o Tesoureiro Geral das Tropas, ao qual o Intendente participará, ex-offício, o desembarque de cada Oficial, e o Pagador dos Armazéns, com exacção e simplicidade, os seus pagamentos respectivos; evitando-se por este saudável meio, a confusão e a desordem inseparáveis da complicação de pagamentos e de soldos de terra e de soldos de embarcados. Para o mais regular serviço do Arsenal Real da Marinha: sou servido criar também três Apontadores, cada um com 420 réis diários: e dois Guardas, com 320 réis por dia. E este se cumprirá tão inteiramente como nele se contém. Pelo que mando, Que assim se observe em tudo e por tudo, e que se registe onde necessário for. Dado no Palácio do Rio de Janeiro 13 de Maio de 1808."
PRÍNCIPE com guarda
Visconde de Anadia
Alvará pelo qual Vossa Alteza Real há por bem criar uma Contadoria da Marinha, na forma acima declarada.
Para Vossa Alteza Real ver.

Francisco Xavier de Noronha Torrezão o fez.



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